sábado, 14 de abril de 2012

estrela pequenina

tocadores, vinde tocar
marimbas, n’gomas, quissanges
vinde chamar nossa gente
p’rá beira do grande Mar!

sentai-vos, irmãos, escutai:
precisamos entender
as falas da Natureza,
dizendo da nossa dor,
chorando nossa tristeza.

ora escutai; meus irmãos:
aquele sol no poente,
vermelho como uma braza
não é sol somente. Não!
é coágulo de sangue
vertido por angolanos
que fizeram o Brasil!

ouvi o mar como chora,
ouvi o mar como reza…

olhai a noite que chega,
veludo negro tecido
de mil pedaços de pele
arrancados a chicote,
ai! Cortados a chicote,
do dorso da nossa gente,
no tempo da escravatura…

noite é luto
de que Deus cobre o mundo
com dó de nós…

disco de prata luzente
sobe ligeiro no espaço.
sabei que a Lua fulgente
contém lágrimas geladas
por pobres negros choradas…

pergunta-me a multidão,
sentada à beira do mar:
- agora dizei, irmão,
aquela pálida estrela
tão pequenina e humilde
que brilha no nosso céu
qual é o significado?

talvez seja finalmente
Deus a olhar para a nossa gente…


Maurício de Almeida Gomes (1920)
Luandense. Integra a Antologia dos novos poetas Angolanos, de 1950 e tem colaboração na “Cultura I”, “Cultura II” e “Mensagem”.

1 comentário:

  1. Lendo este poema, não se pode deixar de pensar no sofrimento infligido pelos europeus aos indígenas "descobertos" de quem fizeram "gato sapato", de acordo com interesses económicos e em nome de pseudovalores de conveniência.

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