O saco
Vinha de longe carregada com um
saco. Os anos tinham-na desgastado, a ela e ao saco. Embora quase vazio, via-se que pesava naquela
cerviz abaulada. Perguntava-se que traria ela no saco. Ninguém sabia. Se lhe
perguntavam, ela mudava de conversa. Se lhe ofereciam ajuda para o transportar,
ela apertava-o contra si. Jamais o abandonava, nem a dormir.
Certamente é o saco das
recordações da sua longa vida. Talvez – alvitravam.
A caminheira passava na aldeia
uma vez por ano. Parava no cemitério e continuava viagem. Durante uns dias falavam dela e do seu saco intrigante.
Certo dia de inverno,
chegou mais tarde e adormeceu sobre o mármore rosa da campa fria. A noite gélida
desceu sobre ela e, lentamente, enregelou-a.
A primeira cuidadora a chegar
deparou-se com o cadáver e o saco aberto e vazio. Pretendendo encontrar uma pista decifradora do conteúdo secreto, teve o cuidado de virar o saco do
avesso e sacudir com força, ajudada pelo vento forte, que o desfez e o levou.
17 de setembro 2019
mjlad