Em carta datada de Paris, 16 de Novembro de 1912, a Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro escreve «com péssimo estado de espírito e num dia chuvoso, enervado, escuro como breu». A dada altura, explica a razão do seu sofrimento:
- «Diante de mim, a estrada vai pouco a
pouco estreitando-se, emaranhando-se, perdendo o arvoredo frondoso que a
abrigava do sol do vento. E eu cada vez mais me convenço de que não
saberei resistir ao temporal desfeito - à vida , em suma, onde nunca
terei lugar.
Vê você, eu sofro porque sinto próxima a hora em que o recreio vai acabar, em que é forçoso entrar para as aulas. [...] Em suma não creio em mim, nem no meu curso, nem no meu futuro. [...]» (Cartas de Mário de Sá- Carneiro a Fernando Pessoa, edição Manuela Parreira da Silva, Assírio e Alvim, pp.15-16).
- A temática do recreio é retomada por Sá-Carneiro em Outubro de 1915:
O Recreio
Na minha Alma há um balouço
Que está sempre a balouçar -
Balouço à beira dum poço,
Bem difícil de montar...
- E um menino de bibe
Sobre ele sempre a brincar...
Se a corda se parte um dia
(E já vai estando esgarçada),
Era uma vez a folia:
Morre a criança afogada...
- Cá por mim não mudo a corda,
Seria grande estopada...
Se o indez morre, deixá-lo...
Mais vale morrer de bibe
Que de casaca... Deixá-lo
Balouçar-se enquanto vive...
- Mudar a corda era fácil...
Tal ideia nunca tive...
Mário de Sá-Carneiro