sábado, 18 de julho de 2009

Polémica ajardinada

- Fernando Pessoa considerava a polémica cultural capaz de fazer avançar culturalmente o país; talvez, por isso, tenha despoletado a polémica com a sua profecia da chegada próxima do "supra-Camões".
- Não me digas que isso vem a propósito das polémicas do Jardim da Madeira? Ofendes Pessoa.
- Estive a pensar no assunto Jardim e concluí que, no momento em que o tema da polémica política não lhe interessa, ele lança alguns temas chocantes, para acender os ânimos e pôr o país a olhar para a sua figura verborreica. Contudo, podemos tirar proveito cultural da situação discursiva, se aprofundarmos culturalmente a questão. Ora pensa: neste momento, quantas pessoas terão ido ler a Constituição para contextualizar as suas palavras? Eu já fui. E tu?
- Eu li e compreendi, que o socialismo ficou na gaveta da História Portuguesa, na sétima revisão constitucional de 2005. De facto, só aparece no preâmbulo da Constituição, com carácter de fazer História:
"A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno".
- OK! Já entendi, por que decoraste essa parte. Nesse parágrafo ainda há uma palavra a incomodar Jardim: "socialista" - "sociedade socialista".
- Mas afinal ele está filiado na social-democracia que também tem como objectivo, a longo prazo, a sociedade socialista!
- Pois, se ele é membro destacado do PSD, ele sabe que no programa desse partido está escrito:"Continua a ser no espaço da social-democracia reformista que se podem conjugar, com equilíbrio, os valores da liberdade individual, da igualdade de oportunidades, da solidariedade e da justiça social».
- Centremo-nos na polémica Proposta de Revisão Constitucional do PSD Madeira. É certo que essa proposta pretende que o comunismo não seja tolerado na democracia portuguesa, tal como o fascismo não é?
- Foi isso que me pareceu. Mas a Constituição não proíbe ideologias. Para tirar isso a limpo, fiz o levantamento da palavra "fascista" na Constituição: aparece três vezes. A primeira, para dizer que a revolução se fez para derrubar o "regime fascista"; a segunda,no artigo 46, para proibir "organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista"; a terceira, no artigo 160, sobre a perda do mandato de Deputado, por "participação em organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista».
- Daí se conclui, a partir do preâmbulo, que, se a Revolução dos Cravos foi feita contra o fascismo, lógico é que se proíbam as suas organizações.
- O mesmo acontece na Alemanha.
- Parece-me que Jardim pretendeu pôr o país a pensar no assunto. Voltou a levantar o papão, nesta hora de convulsão eleitoral.
- Subiu-lhe à cabeça a vitória do PSD na Eleição para Deputados Europeus e achou que tinha chegado a sua hora de invadir o continente, pelo menos com a sua verbe rotunda.
- Parece-me que é assim que ele mede a temperatura à sua popularidade nacional...
- O seu desejo secreto é certamente a invasão.
- Mas afinal que escreveu ele nessa Proposta?
- Em "Outras Alterações Pontuais", o documento propõe «o esclarecimento de que a democracia não deve tolerar comportamentos e ideologias autoritárias e totalitárias, não apenas de Direita - como é o caso do Fascismo, esta expressamente prevista no texto constitucional - como igualmente de Esquerda - como vem a ser o caso do Comunismo, não previsto no texto constitucional - assim se justificando a referência a ambas as ideologias, no art.º46º, n.º4º e no art.º160º, n.º1, al.d), da CRP».
- Esqueceu a História Portuguesa ou quer já enterrá-la em vida?
- Assim parece.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Arte de dar nas vistas

- Terei ouvido bem? Alberto João Jardim quer expulsar o comunismo da constituição????
- Ou será que quer o nazismo na constituição?
- Para ele, os dois assemelham-se.
- Será que não conhece a utopia comunista, a longo prazo, de uma sociedade igualitária em direitos e deveres?
- Ou será que pensa que o nazismo não tem em vista a selecção dos melhores (para quem?)
numa sociedade desigual e agressiva? Passaria ele nessa selecção?
- O senhor da Madeira quer polémica...
- Ou encurralar a presidente do seu partido.
- A ver vamos. Ainda estamos na cena 1.

A escola inclusiva e o bem comum

- Olhando para a sociedade actual, há que optar entre viver na indiferença dos problemas gerados pela pobreza ou lutar por uma sociedade mais justa.
- A última opção é coerente com o cristianismo, que pretende uma vida digna e justa para todos, em fraternidade.
- Numa Escola, colocar-se-ia o problema da igualdade de oportunidades, na perspectiva da escola inclusiva.
- Curioso! Avaliando a minha Escola, verifico que não há uma relação directa entre catolicismo e pedagogia da escola inclusiva. Salvaguardem-se as excepções.
- Pois é. Sempre estranhei essa incoerência. Mas não esqueçamos que a vida e a mensagem de Jesus Cristo são património da humanidade e que os princípios cristãos são absorvidos dentro da cultura judaico-cristã do Ocidente.
- Queres dizer que talvez seja essa uma das possíveis razões que levam alguns professores a trabalhar tão afincadamente pelo sucesso de todos os seus alunos,incluindo aqueles alunos que têm problemas de aprendizagem?
- Sim. Pergunto-me com frequência porque é que alguns seres humanos lutam pelo bem comum e outros se lhe opõem.
- Também me interrogo se o conceito de "bem comum" reúne consenso.
- Como pode "um escola para todos" não estar abrangida pelo conceito de "bem comum"? Não entendo que não haja um consenso acerca disto.
- Claro está que há um consenso teórico; o que não há é uma prática coerente com o princípio.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

O mito da escola inclusiva

- Estou a ler um texto teu de 2000, sobre a escola inclusiva.
- Ah! As escolas, como é o caso dessa em que eu trabalhava, não se importam de colocar essa parangona no seu projecto educativo, mas não querem dar passos decisivos para atingirem essa meta.
- Não admira. Uma escola inclusiva pressupõe uma sociedade inclusiva, nem que seja numa miragem utópica. E quem a quer?
- Acho que tens razão. Mas poderá um humanista não trabalhar para que ela se torne uma realidade?
- Depende do conceito de humanista. Quantos humanistas confessos defendem uma escola exclusiva, a dos melhores, a dos adaptados ao sistema, propondo a exclusão dos outros? E isso em nome do bem da maioria.
- Só que a maioria não é a totalidade... Qual o projecto educativo para os inadaptados do sistema escolar? Fazer turmas ou escolas-guetos de inadaptados?
- Isso parece-me péssimo. Juntar problemas não os resolve, complica-os.
- Penso que a escola inclusiva ainda pertence ao desejo de uma minoria de educadores.
- Permite-me que leia parte do último parágrafo do teu texto, para que se possa comentar a nove anos de distância: «A integração e a inclusão produzem-se em ambiente de inovação que é sempre um processo de tensão entre a vontade de mudar e o imobilismo. Ideais e hábitos lutam entre si».
- Claro que, nesse âmbito, existe uma luta, dentro de cada professor e fora dele.Penso que, nessa escola, aconteceu e continua a acontecer uma batalha campal, tal como previra. Porque muito está em causa, tal como Miguel Zalbaza escrevia em «Diversidade e Currículo escolar», nomeadamente a instituição.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Parabéns a Sophia de Mello Breyner

A Sophia de Mello Breyner Andresen (n.6 de Novembro de 1919, f. 2 de Julho de 2004), no primeiro lustro da sua morte, uma homenagem à vida:

Parabéns, ó imortal!
A tua poesia é puro cristal.

Entraste no cortejo de Homero,
A melhor companhia
De toda a Poesia.
E as vossas vozes
Atravessam os tempos
E ecoam
Em polifónica harmonia

(seniora)

Maria de Lourdes Pintassilgo

- Estamos em Julho. Quem celebramos?
- Estou a folhear o Jornal de Letras. Vejo aqui «Ciclo sobre Pintassilgo»...
- Adoro pássaros. E esse é o nome mais sonoro da passarada. Mas não sabia que também te interessavas?
- Até me interesso... assim... de um modo geral. Mas agora não me refiro a pássaros, mas a Maria de Lourdes Pintassilgo.
- Gosto do nome. Começa com a leveza de Maria, entra na profundeza grave de Lourdes, e canta e voa em Pintassilgo. Mas de quem estamos a falar?
- De uma cidadã portuguesa, engenheira e política, com esse nome, nascida em Janeiro de 1930 e falecida em 10 de Julho de 2004.
- Ah! Entendo. Estás a responder à minha primeira pergunta. Estava perdido. Bem... e o que celebramos concretamente?
- A sua cidadania e o modo como a exerceu.
- Preciso de saber mais.
- Vê só: foi a primeira mulher (e única até ao momento) a desempenhar o cargo de primeiro ministro em Portugal e a segunda da Europa.
- Uma pioneira nacional. E isso aconteceu, quando?
- No V Governo Constitucional, que tomou posse a 7 de Julho de 1979 e terminou a 3 de Janeiro de 1980.
- De muito curta duração...
- Em tempos de crise... imagina que a sua governação termina com a dissolução da Assembleia da República... As crises sucessivas da governação nacional, se exceptuarmos a curta época das vacas gordas...
- Mas não era sobre isso que estávamos a falar.
- Pois, para saberes mais sobre Pintassilgo, podes consultar o seu portal Fundação Cuidar O Futuro , nele poderás obter as informações necessárias.
- E no Jornal de Letras?
- Ah, sim, já me esquecia. Anuncia um ciclo de conferências de homenagem (de 25 de Junho a 10 de Julho), intitulado A Dimensão do Cuidar na Re-significação do Espaço Público, integrado no projecto Mulheres, Ética e Espaço Público.