sábado, 17 de abril de 2010

ÍTACA de C. Cavafy

ÍTACA de C. Cavafy

«Quando empreenderes a viagem para Ítaca
pede que o caminho seja longo,
cheio de aventuras, cheio de descobertas.
Pede que o caminho seja longo,
e numerosas as manhãs
em que os teus olhos descubram um porto ignorado
e numerosas as cidades onde buscarás o saber.
Conserva sempre no coração a ideia de Ítaca.
Deves alcançá-la, é o teu destino
mas não forces a travessia.
Mais vale que ela dure muito tempo
e que sejas velho quando deitares a âncora,
enriquecido com tudo o que tiveres encontrado no caminho
sem estares à espera de mais riqueza ainda.
Ítaca deu-te uma bela viagem
sem ela não terias partido.
E se a achares pobre, não é que Ítaca te enganou.
A sabedoria que adquiriste
permite-te compreender o sentido das Ítacas.

Mais além, deves ir mais além
das árvores que te prendem
e quando as tiveres ultrapassado
Trata de não parar.
Mais além, deves ir mais além
além do presente que te prende ainda
e quando estiveres solto
retoma de novo a viagem.
Mais além, sempre mais além,
além da manhã que já se aproxima
e quando julgares que chegaste, sabe procurar novos caminhos.

Boa viagem aos guerreiros
que são fiéis ao seu povo.
Que o deus dos ventos seja favorável
ao velame dos seus navios.
Apesar do seu velho combate
que achem o prazer dos corpos mais amantes.
Encham as redes de estrelas cobiçadas,
cheios de venturas, cheios de conhecimentos.

Boa viagem aos guerreiros
se forem fiéis ao seu povo.
Apesar do seu velho combate,
que o amor encha os seus corpos generosos
que encontrem o caminho dos velhos desejos,
cheios de venturas, cheios de conhecimentos.»

(Desde 1976 que o poema ÍTACA de C. Cavafy, na tradução livre de João Medina, me acompanha e me ajuda a conduzir a nau, por isso, decidi transcrevê-lo.)

O TEMPO

Falando de odisseias a pensar na viagem aventurosa de Odisseu, mas a pensar sobretudo na vida dos humanos (não como viagem de eterno retorno, mas como viagem com destino marcado, ainda que à espera de uma surpresa ), deparamo-nos sempre com a viagem no tempo e no espaço.
Ainda sobre o tempo, ouçamos Baudelaire: «Oui! le Temps règne; il a repris sa brutale dictature. Et il me pousse, comme si j'étais un boeuf, avec son double aiguillon. - "Et hue donc! bourrique! Sue donc, esclave! Vis donc, damné!"» (Baudelaire, Le Spleen de Paris).

Que tempo é este que nos encabresta
Ou que faz de nós uma festa

(Faz e desfaz / A bel-prazer / O que lhe apraz / olhem o género / só podia ser/ rapaz)